Brasil – Quando a Caldeira Explode

Ontem à noite entrei em estado de choque, de tristeza e alegria, assistindo e me inteirando dos protestos e acontecimentos do Brasil desde domingo.

Sou uma brasileira transformada australiana. Nasci no Brasil mas deixei-o há quase doze anos atrás. Saí porque sempre me senti um pouco alienígena no nosso país, com minhas idéias diferentes e a vontade de ler na hora do almoço várias vezes por semana, ao invés de jogar papo fora. Só não lia muito porque me sentia estranha.

E sentar na grama na hora do almoço, na empresa? Aquele gramadão bonito, macio, super bem cuidado, só para ver. Também, na minha imaturidade, não tinha coragem. Se fosse hoje

A outra idéia estranha é de que chefe tem que ser gente e tratar gente feito gente, não funcionário feito lixo. Que empresas têm responsabilidade com seus funcionários, mas que os funcionários também têm responsabilidade com suas empresas, entre muitas outras coisas.

Por isso, fui embora, emigrei para a Austrália, em busca de qualidade de vida e uma cultura mais próxima do meu alien interno. Achei.

Na verdade, ontem fiquei sabendo um pouco mais de tudo que gerou os protestos, as “tranqueiras” do Lula guardados no galpão, a extensão da operação lava-jato, as condenações, a escala da corrupção. Fiquei sabendo mais sobre o problema do Zica, o absurdo da Dilma oferecer al Lula um ministério, até um pouco sobre a lama de Mariana e assim vai.

De vez em sempre me reuno com dois outros brasileiros para assistir velhas séries e novelas brasileiras. Assistimos o Roque Santeiro, a Tieta, Decadência, Que Rei Sou Eu, estamos vendo Riacho Doce agora. Mas ontem ao invés de assistir nossa novela planejada, precisamos mergulhar no youtube e descobrir o que estava acontecendo.

Meu espanto foi tanto que achei que podia me jogar da sacada da casa da minha amiga que ia sair voando. Eu só podia estar sonhando. A gota d’água para mim foram o sumiço das obras de arte do Palácio do Planalto e — como não poderia deixar de ser para qualquer escritor — o mais penoso foi ler uma lista que dizia que o Lula tinha levado duzentos livros na mudança. Não consigo acreditar que os duzentos livros eram dele.

O Portinari, gente, o Portinari faz parte da história da minha família. Numa outra lista notou-se o desaparecimento de uma obra do Portinari, fico aqui com esperança de que isso seja uma mentira, ou que eles encontrem a obra no tal armazém que não é do Lula mas que guarda as “tranqueiras” dele. Que ofensa.

O sangue ferveu, o cérebro parou, o queixo caiu, possivelmente até babei.

Por outro lado, ver os protestos me encheu de felicidade, não só pelo movimento em si, o maior impacto para mim é no orgulho do brasileiro, no patriotismo, no apoio à polícia federal, ao poder judiciário. Deixou-se de lado a descrença de que alguma coisa pode ser feita. Vejo uma grande chance do brasileiro recuperar o orgulho e o conceito de honestidade.

O fato de que tanta gente foi condenada, está indo para a cadeia, que o ex-presidente foi obrigado a depor e pode ser preso, que existe uma saída, é muito encorajador. Estou cheia de esperança e alegria, pensando no impacto disso no dia-a-dia do brasileiro, que em um grande movimento passou a celebrar o que é certo.

Espero que o grito de milhões de brasileiros leve aos corações dos nossos mal pagos policiais e judiciários, um alimento que os mantenha na linha e que os que estejam fazendo ou pensando em fazer algo que prejudique os outros, se lembre que existem consequências. Esse eu acho que é o verdadeiro poder desses protestos, a semente que planta na idéia de cada um e especialmente das novas gerações: o fim da lei de Gerson.

[Nota: o texto em inglês é bem diferente desse em português, em inglês eu escrevi para o estrangeiro, em português para o brasileiro.]

[Crédito da imagem utilizada: http://www.economist.com/blogs/americasview/2013/06/protests-brazil]

Fazendo uma maratona… de escrita!

Dia primeiro de novembro, além de ser muito importante por causa do aniversário do meu pai, marca também o inicio mundial da Maratona de Escrita do website nanowrimo.org.O objetivo é escrever um livro em um mês. São 50,000 palavras o que faz com que o objetivo diário seja escrever 1667 palavras.

Por enquanto estou adiantada, no terceiro dia da maratona.

Ontem eu voltei para casa andando pela praia, parei no caminho para escrever e, como diz um amigo meu (obviamente brasileiro), ver bunda passar. 

Enquanto eu escrevia, passou bunda, passou boiada… cachorro, criança, nadadores, atletas (um desses passou cinco vezes, até eu ficar cansada só de olhar). 

Um casal parou para admirar como eu conseguia escrever sem olhar para o teclado.

É realmente um grande benefício, poder escrever olhando o mar e bunda passar… 

 

Inspiration Outside of Me

I have finished a Masters in Arts, Creative Writing, at UTS, in June 2015. At the time I didn’t feel the accomplishment, the excitement in finishing up, just a bit of relief. I loved the course most of the time, I loved almost all classes and felt inspired throughout. At the end I was feeling it was just a bit too much outside input into my writing and I was loosing myself.

When I completed the final assignment I was left with more questions than answers. I started the course to gain technique to write in English, but more specifically, the project I used throughout the course: my non-fiction, written like fiction, comedic, novel, about my friend who is a Brazilian, migrated Australian, who has been a belly dancer in Sydney, performing mostly in the middle Eastern Communities of the city.

As you can notice, it is a complicated project and I needed help to set it up. The inspiration and the stories are not a problem, how to link them, present them and frame them is my challenge.

I had hoped that by the end of the Masters I would have found this structure, but I found only the questions I need to answer in order to find this structure and a bit of a sense of being lost.

I gained a lot of technique and believe I am much better equipped now then before I started. I have a thicker skin and a knowledge of where to look for information too.

By the time the Graduation Ceremony arrived I was able to release the impressions of not getting as far as I wanted and had the most beautiful day  with my sister and my friend (the Muse, the Character).

The following day, it was Elizabeth Gilbert who made me realise why I felt and should feel happy and accomplished. We have TED Tuesdays at work and we watched Elizabeth’s talk that day.  She explained that a valid idea is to think of  divine inspiration as, well, divine, as is coming from outside you.

I remembered that when I was in classes no teacher would say: you chose the voice, the tone, the verbal tense, define the character and then you pray, or talk to your daemons, or to your genius, and ask for guidance. As it would be expected, we are taught to control, to wrestle with our internal intellectual gifts and bend the words into shape.

I realised that was the one thing I forgot during these studies, the thing I lost connection with, the part that lives outside of me: the sudden, potent, and magical inspiration that makes a text become funny with a few twists of words, or that make people love what you wrote even when it is imperfect.

When I heard Elizabeth talking about this part of the creative process that is not my own I was relieved of the responsibility to do it all alone, by myself, with my second language, happen. I was given the solution to all my problems and the certainty that it will come to me, and the book will be able to carry the immense fun that the stories are.

I have a super-power, an intuition capable of seeing through the veil of what is hidden to the naked eye. Sometimes I know things without an explanation and most times, when these things can be confirmed, they are as I predicted. I have an intuition about this book, I think it will be important.

The second thing the talk gave me was a confirmation of why I was feeling accomplished. Elizabeth explains that artists have one responsibility: keep doing what they love, keep sweating and showing up to their art. That is the only way your genius will find you. I also concluded that honing your technique and getting better and better at it will allow you to transmit the divine inspiration into shape. Imagine what would happen if Van Gogh was able to see the sunflowers in his mind but didn’t know how to paint. His genius would have gone somewhere else.

With these two thoughts — that an artist has to show up to her art and that technique allows you to make real your ethereal inspirations — I saw my new testamur as the proof of how much I am so committed to this art and that I am doing my part, I am showing up to my writing.

Inspiração Fora de Mim

Em Junho de 2015 eu terminei meu Mestrado em Artes, Escrita Criativa, pela Universidade de Tecnologia de Sydney. Naquele momento eu não senti uma sensação de realização muito grande nem fiquei muito alegre de estar terminando o curso, fiquei simplesmente um pouco aliviada. Durante a maior parte do curso eu adorei as aulas e me senti inspirada. No final, entretanto, eu estava sentindo como se tivesse recebido muita opinião alheia na minha escrita e eu havia me perdido um pouco.

Quando terminei o projeto final achei que acabei com mais perguntas do que respostas. Eu comecei o curso para melhorar minha técnica de escrever em inglês em geral, mas eu queria especialmente ser capaz de escrever esse projeto que foi o mesmo que usei para a maior parte dos trabalhos durante todo o mestrado: é um romance de vida real, escrito num estilo de ficção, com um tom de comédia, sobre a minha amiga que é brasileira, imigrada para a Austrália, e foi uma dançarina do ventre em Sydney, se apresentando principalmente nas comunidades de culturas do oriente médio da cidade.

Pode-se perceber que o projeto é complicado e eu senti que precisava de ajuda para prepara-lo. Nunca achei difícil ter inspiração ou encontrar as histórias, o difícil para mim era encontrar como apresenta-las, estrutura-las e organiza-las.

Eu imaginava que quando chegasse ao final do curso eu teria encontrado essa estrutura. Na verdade encontrei as perguntas que preciso responder para, ai sim, encontrar essa estrutura e, com isso, encontrei uma sensação de estar meio perdida.

Eu ganhei muita técnica e me sinto muito melhor equipada do que quando comecei. Também desenvolvi resistência a críticas e uma habilidade de saber onde procurar informação.

Quando chegou o dia da cerimônia de graduação eu fui capaz se me livrar da idéia de não ter chegado onde queria ter chegado e eu tive um dia magnífico com minha irmã e minha amiga (a Musa, a Personagem).

No dia seguinte, foi a Elizabeth Gilbert, quem me fez perceber que eu deveria sim me sentir feliz e realizada. Nós temos Terça TED no trabalho e assistimos a palestra da Elizabeth naquele dia. Ela explicou que é válido imaginar que a inspiração divina é exatamente isso: divina, e portanto vem de fora da gente.

Eu me lembro que durante as aulas nenhum professor me disse: você escolhe a voz, o tom, o tempo verbal, defini o personagem e aí começa a rezar, ou falar com os seus gênios, ou seus daemons, ou anjos e pede guiança. Como seria de se esperar, nós somos ensinados a controlar, a lutar com nosso intelecto e marretar as palavras até que tomem a forma que queremos.

Eu percebi que a coisa que eu havia esquecido essa uma coisa durante meus estudos, que eu havia perdido o contato com essa parte que mora fora de mim: a súbita e super potente, mágica inspiração que faz um texto virar engraçado com umas pequenas mudanças, ou que faz com que as pessoas amem o que você escreveu mesmo se imperfeito.

Quando ouvi a Elizabeth falando dessa parte do processo criativo que não é minha, fui aliviada da responsabilidade de fazer tudo sozinha, com essa linguagem que aprendi depois de adulta. Eu recebi a solução para todos os meus problemas e a certeza de que vou chegar lá e escreverei esse livro que será capaz de transmitir o quanto as histórias são divertidas.

Eu tenho um super-poder, uma intuição que é capaz de ver além do que está à vista. Algumas vezes eu sei de coisas sem explicação e na maioria das vezes, quando essas coisas podem ser confirmadas, elas são exatamente como eu predisse. Eu tenho uma intuição sobre esse livro, eu acho que ele vai ser importante.

A outra coisa que a TED me mostrou, foi porque eu passei a me sentir realizada. A Elizabeth explica que artistas têm uma responsabilidade: continuar fazendo o que amam, continuar suando e trabalhando em sua arte. Essa é a única maneira que o seu Gênio vai aparecer para você. Eu conclui também que continuar melhorando sua técnica é o que te permite transformar uma inspiração divina na obra de arte. Imagine o que aconteceria de Van Gogh pudesse ver os girassóis em sua mente mas não soubesse pintar. O Gênio dele iria para algum outro lugar.

Com esses dois pensamentos — que um artista tem que trabalhar na sua arte, e que a técnica é o que te permite transformar idéias em obras — é que eu fui capaz de ver o meu diploma como a prova de o quando estou comprometida com minha arte, que estou fazendo a minha parte, estou sempre presente e ativa em minha arte, a escrita.

Instrumentos

No momento eu tenho 3 amores-da-minha-vida:

1) meu computador — onde todas as minhas idéias estão arquivadas. Foi um presente dos meus pais, o melhor do mundo. Meu lindo MacBook Air, com o tamanho e peso de um ipad, um teclado super macio, dessa empresa que tem tudo a ver com meus valores: criatividade, design, beleza, sensualidade (sim, o Mac tem uma linha sensual) e agilidade. Eu posso carrega-lo para todo lugar e posso escrever em qualquer lugar. E ele contém o meu outro amor-da-minha-vida: meu software de escrita…

2) meu scrivener — a descoberta que mudou a minha vida de escritora, esse programa de computador que possibilitou que eu organizasse todas as minha idéias. É perfeito para compilar projetos. Quando voce quer criar um livro você pode separar as idéias por capítulos e simplesmente ir em cada parte e preencher com o conteúdo em si. Você também pode mover as partes e capítulos de lugar e guardar itens pesquisados, notas, etc. Por final, o programa exporta o arquivo para muitos formatos, inclusive a maioria ou todos os formatos de livros eletrônicos. Amo esse negócio!

3) minha nespresso — o alimento, ainda que uma bebida, para meus pensamentos; máquina com a qual faço cappucinos mágicos, com chocolate derretido que energizam minhas idéias. Outro presente dos meus pais e minha irmã.

O WordPress da Minha Mente

Eu escrevo porque escrevo o tempo todo, mesmo sem papel e caneta, ou até sem um computador, escrevo por dentro sem parar. Tudo que acontece ao meu redor vira uma crônica no meu blog interno imaginário. Eu falo como se estivesse escrevendo, algumas vezes. O que me traria maior pesar na vida seria ter que para de escrever.

Eu já até criei histórias do que aconteceria comigo se eu tivesse que parar de escrever ou se não tivesse nada com o que escrever. Imaginei, em que situação uma pessoa não pode escrever? E ainda, o que essa pessoa faria?

Eu enlouqueceria porque quando preciso escrever algo, o escrito fica em looping na minha cabeça, e se repete incessantemente, em diálogos ou parágrafos, até o momento que eu posso sentar e passá-los para o papel.

Se eu não tivesse acesso a um computador, ou papel e caneta, eu teria que lembrar todas as frases que minhas experiências estariam criando… a minha memória certamente se expandiria, assim como o meu desespero.

Why Australia?

The other side of the world, really? My friends and family have difficulty to understand why, but once explained it gets easier to get.

After I came to the conclusion that I needed a good life in order to feel inspired to write (see the post called “when did I start writing?”) I started looking for ways to achieve that.

I know many people find inspiration and energy inside a depression to write. I knew then as I know now that people write no matter what if they feel the drive. Unfortunately I’m not one of those, I am not good with sadness, with being unhappy or tragedies, it is not my forte. Instead I spend my energy working hard and changing things, making life better and then writing about it when I am feeling energised and inspired, harvesting the work I put into earlier.

Of course I have to keep in perspective the fact that I am quite privileged as the worst that ever happened to me makes for the better that might have happened to a lot of people.

I was in Brazil and was able to find another job, better than the first, but it turned out it was a copy of the other. I worked 70k from home and shared my rides with a colleague who lived in the same area, who then became my good friend, my most avid reader, and eternal supporter of my writing. We talked endlessly about my writing ideas and tidbits I would write here and there. He was instrumental in my realisation that writing was my path and we still connect technologically to exchange news about our lives and our artistic inspirations.

The job was horrendous, the boss was atrocious, we worked long hours and the travelling was dangerous and tiring. On top of that the company was in a city with two smelly factories.

If I had to choose I would say that water is my element, it often features in my dreams in its many forms. Many times water influenced my life.

When I was about two years old I fell on a stream and the water carried me for some distance. In my memory I was carried away in a river for long metres but my parents barely remember the episode so I think my little child inside exaggerates it a lot.

I grew up spending most of my vacations at my grandfather’s ranch by a large fresh water dam and my parents constantly took us to the beach, even though we lived about 4 hours in-land.

I’m strongly attracted to the ocean and spent many vacations thinking deeply on what I could do to live near the sea.

I used to list in my mind all the cities in Brazil’s coast and wonder if I could find a job in any of them. Reminding the reader that this is way before 2003 and therefore there was no google or job listing website allowing me to search for work Brazil-wide.

The only economically viable option was Rio de Janeiro but I never felt a desire to live there due to the security issues. I investigated Fortaleza in the North and Florianópolis in the South but found it hard to believe I would find a reasonably paying job.

The day before I got married we suffered our first and smaller flood. It was my parent’s property with a river running at the far end of a sort of farm house. Six years later there was another flood, this time 2 meters of water inside the house and my then-husband had to be rescued from the top of the house, by a drunken strong man, on a boat, secured by a rope from the higher ground at the front of the property.

This time we lost everything and for me it was the best thing that could have happened. I had always desired to live abroad and that felt as if the Universe had just pushed me out.

Right at that time my cousin, who was living in Sydney, went for a visit and her accounts of the city made it figure in my mind’s map for the first time. Through her I discovered this city, by the ocean, beautiful, first world, English speaking, and with a migration program, which could be the solution to my problems.

I persuaded the then-husband to consider the option and he ended up agreeing and I came in first to have a look. On the second day I decided I never wanted to live, it was home, it was where I found a piece of my soul I didn’t know was missing. It took some months to arrange a visa for me and for him to join me. Four years later, with a lot of hard work and a pastry chef diploma with 900 hours in the kitchen later, I got our permanent residency, and we got divorced shortly after.

To finalise, the reason I moved here was to write and have a good life, and that I am daily achieving.

Austrália Porque?

Precisava ser do outro lado do mundo, jura? Minha família e meus amigos acham difícil de entender porque mas depois que eu explicar o processo fica mais fácil de entender.

Depois que eu cheguei à conclusão que eu precisava de uma boa qualidade de vida para me sentir inspirada para escrever (veja o texto chamado “quando comecei a escrever?”) eu comecei a procurar maneiras de fazer exatamente isso.

Eu sei que muitas pessoas se sente inspiradas e até energizadas para escrever quando deprimidas. Eu sabia naquela época, como sei agora, que não importa como você se sente você pode escrever. Lamentavelmente, eu não consigo, eu sou péssima com tristeza com tragédias e infelicidade. Eu prefiro investir minha energia e trabalhar duro em mudar minha condição, fazer a vida melhor para mim e aí escrever. Quando estou me sentindo energizada e inspirada, ai sim posso colher o resultado do meu trabalho.

É claro que sou privilegiada e tive muitos benefícios na vida o que fazem que o pior que já aconteceu comigo ser de baixo nível dramático para muita gente.

Quando estava no Brasil, consegui um trabalho melhor do que meu primeiro emprego, mas mesmo assim este se mostrou quase que uma cópia do outro que era bem ruim. Eu trabalhava há 70 km de casa e revezava dirigir com um colega de trabalho que vivia na mesma cidade, Campinas. Esse moço se tornou um grande amigo e meu leitor mais ávido e eterno suporte em minha escrita. A gente conversava as várias horas de viagem sobre meus textos e personagens, minhas idéias e os pedaços escritos aqui e ali. Ele foi instrumental em me fazer chegar à conclusão de que meu caminho era a escrita. Nós ainda somos amigos nos conectando de vez em quando tecnologicamente para trocar notícias das nossas vidas e nossas inspirações e aspirações artísticas.

O emprego era horrível, o chefe era um troglodita, trabalhávamos muitas horas extras e a viagem era perigosa e muito cansativa, além de que, a empresa ficava numa cidade vizinha com duas fábricas fedorentas.

Se me dissessem que eu tenho que definir qual é o meu elemento, eu diria que é a água. Esse elemento sempre aparece nos meus sonhos em todas as suas formas, várias vezes a água influenciou minha vida.

Quando tinha dois anos de idade eu me lembro de cair num riachinho e ser carregada pela água por alguns segundos. Na minha memória o riacho era um rio volumoso que me arrastou por muitos metros mas como meus pais mal se lembram desse episódio eu diria que a criancinha dentro de mim exagera um bocado a proporção do evento.

Eu cresci passando a maior parte das minhas férias no rancho do meu avô que ficava à beira da represa de Rifaina, uma das represas do Rio Grande em São Paulo, divisa com Minas-Gerais. Além disso, meus pais sempre nos levavam para a praia, mesmo que morássemos em Campinas, há mais ou menos quatro horas de distância do mar.

Eu sinto imensa fascinação pelo oceano e passei muitas horas de minhas férias pensando como eu poderia morar perto do mar.

Eu costumava listar todas as cidades da costa brasileira mentalmente e imaginar se havia uma maneira de conseguir morar e trabalhar em uma delas. Lembrando ao leitor que isso era bem antes de 2003 e portanto não existia google e pouquíssimos websites para se procurar emprego ao redor do Brasil.

A única opção economicamente viável era o Rio de Janeiro, mas nunca quiz morar lá por causa da violência. Eu considerei Fortaleza, CE e Florianópolis, SC mas achei que a probabilidade de conseguir bons empregos nessas cidades era pequena.

No dia anterior ao meu casamento sofremos uma enchente, não muito grande. Morávamos numa chácara dos meus pais pelo fundo da qual o Rio Anhumas passa. Seis anos depois uma outra e maior enchente aconteceu e dessa vez, dois metros de água entraram na casa e meu marido (na época) teve que ser resgatado do teto, por um homem bêbado mas forte que realizou o feito com um barco de alumínio, guiado por uma corda que nós segurávamos da rua, que estava num nível elevado em relação à casa.

Dessa vez perdemos tudo e, para mim, foi a melhor coisa que poderia ter acontecido. Eu sempre quiz morar no exterior e senti como se o Universo tivesse colocado os dois pés na minha bunda e empurrado.

Justamente nessa época, minha prima que morava na Austrália foi visitar a família. Ela colocou Sydney no meu mapa mental pela primeira vez. Através dela descobri essa cidade, à beira mar, maravilhosa, primeiro mundo, com a língua que eu já falava, o Inglês, e ainda com um programa de imigração e que só podia ser a solução para meus problemas.

Eu persuadi o marido a considerar a opção e ele acabou concordando. Acabei vindo primeiro para dar uma espiada. No segundo decidi que esse era meu lar e que aqui havia encontrado uma parte de mim que eu não sabia que estava faltando. Levou alguns meses para que pudéssemos organizar um visto para que ele pudesse se juntar a mim. Quatro anos depois com um trabalho muito árduo, depois de um curso de Confeitaria e 900 horas de trabalho na cozinha, consegui nossa residência permanente e nos divorciamos pouco depois.

Concluindo, o motivo pelo qual me mudei para Sydney, foi mesmo para escrever e ter uma boa vida, duas coisas que estou conseguindo dia a dia.

When did I Start Writing?

At a certain point in my life I came to the conclusion that I wanted to be a writer. I find  it hard to remember how or when exactly I got to that point. Probably, a turning point happened when I was about 25 years old and I wrote a short-story that was selected as a finalist for an anthology book. By then I had decided that being a ballet dancer wasn’t for me after all. At 17 I had dropped out of my dance uni degree and moved to advertisement and marketing. At 25 I had been working at a large multinational corporation that was draining my blood.

One day I was driving alone to work, from the car radio I heard a voice saying:

“Writing is your major gift”. I’m aware the phrase is a bit strange but I cannot change the voice from beyond just to fit the English grammar, so I will leave it as is, the closest translation.

That moment I made a decision (based on a voice I imagined because I was delirious of boredom, most probably, but who cares, right?). I had been trying to write more and more and I realised I had to find a way to have a good quality of life to have energy left for writing. If you check the post “why Australia?” you will see how that brought me to Sydney’s beautiful shores.

Although, the decision was made when I was an adult, the more I search for when I started actually writing, the further back I go.

My best friend pointed out to me that none of her childhood friends wrote a story about the time they caught the maid making out with the security guard. I was telling my friend how terrified I was of this maid because she found my story and was very upset at me. Lost in my anguish cause by the upset maid I didn’t realise that most kids don’t write about stuff like I did all the time.

When I first learnt what poetry was, I also sold some poetry to my grandfather which I never delivered because I was then as I am now: hopeless at poetry. I did try though, ended up writing a few lines without an end. I ate my payment in candy and that was that.

I remember the look in the face of my fourth grade teacher when instead of delivering a writing assignment with one page, as I was supposed to do, I delivered twelve pages. Just because I couldn’t cut the story short, stop it in the middle, I had to take the character walking all the way from school to work… Poor teacher, she was a mean one but I’m not sure she deserved that punishment.

A few years later my beautifully-bummed high-school teacher published a book with short-stories, I had a story there. (Beautifully-bummed because as a Brazilian teenager, like all other Brazilian teenagers, I was obsessed with the roundness of people’s behinds around me and such youngish teacher had very nice buttocks that would shake firmly when he wrote on the blackboard.) [Two more notes: I’m still obsessed with round buttocks and at the time it was an actual back board, where you make all that effort to write with chalk.]

While I was on my dancing career path I only thought I would write a book when I retired, I wasn’t really thinking, probably from lack of food, the brain didn’t work very well. I’m grateful to say that I added things up before starving to death and changed my mind. This is my reasoning:

I am not flexible enough to be a prima ballerina + I live in a third world country quite worried about food and health, not art + I can never eat + I am always fat = bad idea.

Once I stopped dancing professionally — I still dance for pleasure — I started writing more, I’ve always had ideas, many, many ideas for being so, even if I had to give up writing about the maid’s kisses.

Quando Comecei a Escrever?

Em certo ponto da minha vida concluí que eu queria ser uma escritora. Acho difícil me recordar exatamente como ou quando cheguei à essa conclusão. Provavelmente um dos momentos decisivos aconteceu quando tinha uns 25 anos de idade e escrevi um conto para os Anjos de Prata, um concurso do Escritor Mário Prata, onde me coloquei em quarto lugar e participei do livro lançado com os melhores do concurso. Àquela altura eu já tinha decidido que ser uma bailarina clássica não era para mim, aos 17 anos eu tinha deixado minha faculdade de dança e mudado para um curso de publicidade e marketing. Aos 25 eu vinha trabalhando em uma grande multinacional que estava drenando minha energia.

Um dia, eu estava dirigindo sozinha para o trabalho, e ouvi a voz do Fernando Morais me dizendo pelo rádio: “escrever é o seu dom maior”. Uma frase um pouco estranha, eu sei, mas não dá para mudar uma voz do além só para fazer o fraseado mais elegante.

Eu costumava ouvir o Fernando Morais falar no rádio então foi a voz dele que imaginei falando comigo, e foi essa frágil loucura que usei para tomar uma decisão. Eu vinha tentando escrever mais e mais e me dei conta que eu tinha que descobrir um jeito de ter uma boa qualidade de vida, para ter energia sobrando para escrever. Se você olhar o texto chamado “Austrália Porque?” vai ver o que me trouxe para a linda cidade Sydney.

Embora a decisão tenha sido feita quando já era adulta, quando mais procuro o momento que comecei a escrever, mais distante no passado eu vou.

Minha melhor amiga me disse que não é todo mundo que escreve histórias de como eles presenciaram a empregada beijando o segurança. Eu estava contando para minha amiga o quanto fiquei com medo da funcionária doméstica porque ela achou minha história e ficou muito brava comigo. Perdida em minha angústia infantil eu nem parei para perceber o quando é incomum, uma criança pequena, escrever sobre sua vida o tempo todo como eu fazia.

Quando eu aprendi o que era poesia eu vendi uma para o meu avô. O coitado nunca recebeu a poesia comprada, porque como poeta eu sou uma excelente novelista. Eu bem que tentei, escrevi algumas linhas sem final. Comi o meu pagamento em balas e foi isso.

Me lembro da cara da minha professora de português da quarta série quando entreguei a ela uma redação de doze páginas ao invés de uma. Eu não poderia parar a história no meio, certo? É claro que a personagem tinha que andar o caminho todo de casa até a escola.  Pobre professora ela era bem chata mas não acho que merecia tamanha punição.

Alguns anos depois meu professor mais lindamente bundado do colegial publicou um livro de contos, e um deles era meu. (Lindamente bundado porque como boa adolescente brasileira eu era obcecada com a beleza das redondezas posteriores ao meu redor, e esse professorzinho novinho tinha um par de redondezas muito belas que chacoalhavam firmemente quando ele escrevia no quadro-negro.) [Dois outros comentários: Eu ainda sou obcecada por belas bundas e naquela época era mesmo um quadro-negro, daqueles que dá um trabalho danado de escrever com giz.]

Enquanto eu ainda progredia na minha carreira de bailarina eu pensava em escrever um livro quando me aposentasse. Acho que não pensava muito claramente, devia ser por falta de alimento. Sou bastante grata de poder dizer que eu calculei as coisas melhor antes de morrer de fome e mudei de idéia. Esse foi meu raciocínio:

Eu não tenho muita flexibilidade muscular para ser uma prima bailarina + eu moro num país de terceiro mundo que se preocupa muito mais com comida e saúde do que com arte + eu nunca posso comer o que quero + eu sempre acho que estou gorda = péssima idéia.

Quando parei de dançar profissionalmente — ainda danço por prazer — comecei a escrever mais, sempre tive milhares de idéias para escrever mesmo tendo que desistir de escrever sobre os beijos da moça que trabalhava lá em casa.